quinta-feira, 2 de junho de 2011

Das estrelas e da chuva




Há algum tempo vejo ruas e avenidas de uma forma diferente. Vejo tudo que não consigo perceber nos dias de cotidiano trivial. As ruas me parecem mais largas quando enxergo uma menina de no máximo dois anos num velocípede cor-de-rosa, correndo da chuva que começa a cair. Lembro da infância, lembro a mim num interior desses qualquer, junto à uma mata de pouco verde e um açude. Um velocípede verde, uma chupeta na boca. Um olhar livre de tudo, de qualquer coisa. Um olhar de até onde o pequeno veículo poderia levar. Meu olhar infantil nunca foi de glória.

Há algum tempo vejo um ônibus coletivo como centro de vida. Conto sempre a quantidade de fones-de-ouvido - a cada ônibus o número só cresce, e quando isso acontece sinto uma imensa felicidade. Conto os idosos, os loucos, os que cochilam. Reparo sempre no rosto do trocador e fico feliz quando Ele é uma mulher - elas (quase) sempre sorriem. Quando desço, geralmente não agradeço como muita gente faz. Uma vez quase caio, porque o ônibus acelerou antes que eu descesse - então fingi dando uma corridinha.

Há algum tempo, muito tempo, gosto de reparar em prédios da cidade. No formato, altura e largura. Gosto dos mais largos. Quando reparo o alto da cidade, percebo que existem tantos prédios despercebidos... Quando estou lá em cima, numa sacada, sinto como se fosse fosse pra frente, já caindo... Já disseram que é instinto suicida. Mas não tenho cacife pra tanta coragem.
Sempre reparo se alguém pendura algo, ou cola algum adesivo nas janelas - uma vez vi uma máscara do bin-láden (Deus conte lá).

Há algum tempo desejo sempre a noite. Gosto das estrelas e da chuva (mas elas não gostam de estarem juntas - pode reparar). A noite me traz uma nostalgia tão efusiva que sinto vontade de chorar, de chorar aquele choro baixinho, gostoso. Aquele choro feliz.

Mas isso só acontece há algum tempo. No meu tempo. No tempo em que encontro a felicidade.

5 comentários:

Edmar disse...

Casa comigo!

Sofia disse...

Lindo! Gosto muito da sua sensibilidade!

Marcos Piva disse...

Que linda essa sua sensibilidade! ❤️

Angel disse...

Tudo que fala e faz é pura poesia, pura porque você é puro, autêntico, raro, olha as entrelinhas da vida, fico feliz em você ter nascido no Brasil, na minha opinião é uma pérola que infelizmente jogaram aos porcos. Mas se você não estivesse aqui, o que seria de nós? Neste país onde poesia, arte não fazem o menor sentido para esses seres cruéis, que sou obrigada a ver todos os dias. Obrigada por existir. Confesso que estou planejando sair deste mundo e nunca mais voltar. Eu tenho o direito de vir e ir, de ficar e de partir. Não estou pedindo ajuda de ninguém, só comentando que o suicídio não é esse horror que falam, que a igreja inventou, é apenas uma decisão, igual a todas as outras que escolhemos. Mas você fique aqui e mostre todo o seu talento, sua alma genial para um mundo que beira à bestialidade.

Anônimo disse...

Seu bom senso nos faz refletir um pouco sobre nós ou quem somos nós.As vezes a vida nos faz chorar ou rir.So tenho a dizer q cada minuto q vivemos precisamos nos entender.