domingo, 20 de setembro de 2009

Demônio Familiar




Meu pai sempre criticou a vizinhança. Dizia pra minha mãe não se enturmar, ficar quieta. Eu não concordava com aquilo, via ser um empecilho para a construção de novas amizades, de segurança no bairro, auxílio. Hoje percebo uma diferença na minha opinião.

Dia desses a vizinha foi convidada para um almoço. Sobre a mesa: pão e vinho.
"Em nome de Jesus, tá é abençoada mulher." - disse ela a minha mãe.
"E essa menina linda, ô glória Senhor!" - disse ela a minha irmã.
E eu na ponta da mesa, calado, observando, esperando.

[...]

"Em nome de Jesus, os problemas vão ser resolvidos." - e me olhou.
"Tá é amarrado todo o mal envolvido aqui nessa casa, Senhor!" - e me olhou.
Vi corpo e sangue derramados sobre a mesa, vi ostentação da Consagrada.
Um ritual de exorcismo, com cabeças tortas, cama tremendo e com direito a 'fuck me' em voz rouca.
Saiu do jantar de barriga cheia.

Dia desses o filho de alguém apareceu, minha irmã convidou para entrar.
"Não! Disseram que aí tem o demônio".

Hoje eu sei que preciso dar meu beijo no rosto da vizinha, para que ela conclua a Via Sacra.


Jesuíta Barbosa

2 comentários:

Honório Félix disse...

Quem são os anjos? E o que nós fizemos para parecermos com o diabo? Talvez nada. Talvez tudo? E se talvez Cristo nos preferir? Porque nem os anjos devem ser do jeito que eles pensam, nem os demônios, nem também o que eu sinto em mim.

Honório Félix disse...

Talvez haja mais coração nos que se parecem com demônios do que em tantos por aí, que tentam, acima de tudo, ser anjos e que mais parecem robôs, que não pensam com a própria cabeça, que não falam com a própria língua, não ouvem com as próprias orelhas e não sentem porque o coração é de pedra.