
Meu pai sempre criticou a vizinhança. Dizia pra minha mãe não se enturmar, ficar quieta. Eu não concordava com aquilo, via ser um empecilho para a construção de novas amizades, de segurança no bairro, auxílio. Hoje percebo uma diferença na minha opinião.
Dia desses a vizinha foi convidada para um almoço. Sobre a mesa: pão e vinho.
"Em nome de Jesus, tá é abençoada mulher." - disse ela a minha mãe.
"E essa menina linda, ô glória Senhor!" - disse ela a minha irmã.
E eu na ponta da mesa, calado, observando, esperando.
[...]
"Em nome de Jesus, os problemas vão ser resolvidos." - e me olhou.
"Tá é amarrado todo o mal envolvido aqui nessa casa, Senhor!" - e me olhou.
Vi corpo e sangue derramados sobre a mesa, vi ostentação da Consagrada.
Um ritual de exorcismo, com cabeças tortas, cama tremendo e com direito a 'fuck me' em voz rouca.
Saiu do jantar de barriga cheia.
Dia desses o filho de alguém apareceu, minha irmã convidou para entrar.
"Não! Disseram que aí tem o demônio".
Hoje eu sei que preciso dar meu beijo no rosto da vizinha, para que ela conclua a Via Sacra.
Jesuíta Barbosa